“Todo dia" no CCSP
“Todo dia”, a 12a Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, partiu da constatação de que discursos e práticas da arquitetura e do urbanismo se renovam a partir do tema do cotidiano. Essa abordagem, que tem um precedente histórico, tematiza os principais temas do mundo pós-crise financeira de 2008. A busca da simplicidade e de um novo engajamento socio-racial, de gênero, e ambiental de profissionais surge como resposta à complexidade das revoluções digitais e científicas, aos desafios do Antropoceno, e à fragilidade das democracias contemporâneas, sobretudo no que diz respeito a diversidade e inclusão.
O evento ganhou o devido senso ao se instalar em um dos edifícios mais significativos da cidade de São Paulo na relação entre arquitetura e o “todo dia”: o CCSP. Edifício-cidade, aberto, equipamento público multi- programático acessível a todos quase como uma extensão do metrô, desde a sua inauguração em 1982, o CCSP é um verdadeiro manifesto do cotidiano. Seus espaços radicalmente generosos e interligados, celebram e amplificam a diversidade do dia a dia: ler, estudar, trabalhar, aprender, relaxar, dormir, brincar, comer, usar o banheiro, assistir a uma peça de teatro, visitar exposições, dançar. O CCSP serve como casa e como palco para os seus mais de 2500 usuários cotidianos de diversas proveniências, que ali ensaiam e apresentam passos de samba, capoeira e K-pop, refletidos em suas fachadas de vidro, sincronizados em seus tetos-jardim, nas suas rampas e passarelas de estrutura híbrida de concreto e aço, nos seus fossos fortificados por muros de tijolos.
A exposição “Arquiteturas do Cotidiano” promoveu o encontro casual entre usuários do CCSP e 70 trabalhos provenientes de 30 países escolhidos dentre mais de 750 propostas a partir de uma chamada aberta internacional: desenhos, maquetes, fotografias, vídeos, instalações interativas, debates, workshops e aulas in-situ de projeto, pontuando o vasto piso Flávio de Carvalho. Ao invés de pano de fundo, o cotidiano diverso do CCSP, e sobretudo as suas imprescindíveis rotinas de manutenção, programou e tomou o primeiro plano da exposição, alinhando-se aos seus temas: trabalhos que relatam histórias urbanas, rurais e domésticas de personagens invisíveis, humanos e não-humanos; celebram experiências coletivas e individuais; falam de espaços ordinários e extraordinários; de ativismo e novas tecnologias que se posicionam contra violências e discriminações. O conjunto, obras e vida cotidiana no CCSP, indica como o todo dia, ao impactar a arquitetura e vice-versa, tem o potencial de subsidiar realidades mais inclusivas e diversas, e comprometidas com a estabilidade ambiental.
O conteúdo de “Todo dia” reverberou as diretrizes da nova gestão do CCSP, que assumiu ainda durante as preparações da Bienal. Diante de circunstâncias sociopolíticas e econômicas ainda mais desafiadoras, a equipe dirigida por Érika Palomino se comprometeu a não somente manter mas principalmente reforçar a vocação do CCSP como local de acolhimento, convívio, diversidade e respeito. Um espaço de liberdade e resistência diários, onde o todo dia é de todo mundo. “Todo dia” com co-curadoria dos brasileiros Ciro Miguel e Vanessa Grossman e da francesa Charlotte Malterre-Barthes, foi selecionada por meio de um concurso público inédito na história das Bienais de arquitetura de São Paulo, organizado pelo Departamento de São Paulo do Instituto de Arquitetos do Brasil (IABsp). A exposição ficou em cartaz no CCSP de setembro a dezembro de 2019.